Deu na Veja: Pedrinhas: a barbárie em um presídio fora de controle
Um
 dos mais violentos e superlotados complexos penitenciários do Brasil, 
Pedrinhas choca o país com cenas de bestialidade e detentos mortos em 
série, expondo o colapso do sistema prisional do Maranhão
Eduardo Gonçalves
Às
 vésperas da virada do ano, o governo do Maranhão anunciou o envio de 60
 homens da Polícia Militar e do Batalhão de Choque para atuar na 
segurança do Complexo Penitenciário de Pedrinhas, em São Luís, que 
chocou o país com cenas de barbárie medieval: decapitações, detentos 
esfolados vivos e cadáveres empilhados após brigas de facções 
criminosas. A ação da governadora Roseana Sarney (PMDB) tinha um 
objetivo claro: evitar uma intervenção federal – precisamente, o envio 
de tropas do Exército – em assuntos internos do Estado. No entanto, logo
 no segundo dia do ano, Pedrinhas contabilizou mais duas mortes em 
circunstâncias não menos cruéis: um preso foi estrangulado até morte e 
outro foi perfurado dezenas de vezes por um “chuço” – objeto pontiagudo 
fabricado pelos detentos, similar a uma pequena lança. O número de 
presos assassinados chega a 62 desde janeiro do ano passado.
Roseana
 tem até esta segunda-feira para responder a um questionamento do 
procurador-geral da República, Rodrigo Janot, sobre a crise que não 
consegue estancar no complexo penitenciário. Cabe a Janot acionar o 
Supremo Tribunal Federal (STF) por uma intervenção federal no presídio. 
Pedrinhas é o maior complexo penitenciário do Maranhão, com capacidade 
para abrigar 1.700 homens. No entanto, atualmente há 2.200 encarcerados 
no local.
Não bastasse o caos no interior
 do presídio, os criminosos encarcerados também tentaram dar uma 
demonstração de força contra o governo maranhense. Após revistas nas 
celas de Pedrinha – foram apreendidas dezenas de celulares e uma pistola
 – nesta sexta, os detentos ordenaram uma onda de ataques nas ruas de 
São Luís. Quatro ônibus foram incendiados, uma delegacia foi alvo de 
tiros e um policial militar foi assassinado. Cinco pessoas sofreram 
queimaduras, entre elas uma criança de seis anos que está em estado 
grave. A Secretaria de Segurança Pública confirmou que a ordem para os 
ataques partiu de dentro de Pedrinhas.
Três
 pessoas suspeitas de participar do ataque a ônibus na cidade de São 
Luís foram presas na noite da sexta-feira, informou o Sistema de 
Segurança do Maranhão na tarde deste sábado. Tanto a Polícia Militar 
(PM) como da Polícia Civil aumentaram o efetivo na região a fim de 
controlar a onda de ataques.
O cenário de
 barbárie foi decrito em um relatório produzido pelo Conselho Nacional 
de Justiça (CNJ) com base em uma inspeção feita em dezembro. O documento
 foi enviado ao presidente do CNJ e do Supremo, Joaquim Barbosa, e ao 
procurador-geral da República. A conclusão do documento é aterradora: 
uma penitenciária superlotada controlada por facções criminosas e um 
governo omisso e “incapaz de apurar, com o rigor necessário, todos os 
desvios por abuso de autoridade, tortura, outras formas de violência e 
corrupção praticadas por agentes públicos”. O texto é assinado pelo juiz
 auxiliar da presidência do CNJ, Douglas de Melo Martins.
Histórico
 – Segundo o documento, os sucessivos motins e as execuções são 
resultado de uma briga histórica entre dois grupos de criminosos, um da 
capital, e o outro do interior, apelidados de “baixadeiros”. Atualmente,
 três facções atuam no local: Primeiro Comando do Maranhão e Anjos da 
Morte, formada por presos do interior, e o Bonde dos 40, a mais violenta
 do presídio e organizada por presos da capital.
Quando
 chegam a Pedrinhas, os novos presos são forçados a aderir a uma das 
facções e informados da principal lei vigente no presídio: quem não 
obedecer aos líderes dos pavilhões será sentenciado à morte. Além de 
conseguir levar drogas e dinheiro para o presídio por meio de 
familiares, alguns são obrigados a entregar a mulher, namorada ou 
familiares para serem abusadas pelo líderes das facções. “Eles obrigam 
os detentos presos por crimes menores a prostituírem as próprias 
esposas, namoradas, sobrinhas e até filhas. O detento que não aceita as 
regras impostas acaba pagando com a própria vida. Casos de estupro 
acontecem rotineiramente”, disse Martins ao site de VEJA.
A
 prática de abuso sexual é facilitada pelo modo como são realizadas as 
visitas íntimas. “As mulheres são postas todas de uma vez nos pavilhões e
 as celas são abertas. Os encontros íntimos ocorrem em ambiente 
coletivo”, afirma o documento. Além das brigas entre facções rivais, o 
desentendimento entre os presos em relação a visitas íntimas é o 
principal motivo das mortes ocorridas no último ano.
Sem controle
 – O método da tortura também é recorrente nos crimes. Um vídeo citado 
pelo documento mostra um detento vivo com a pele da perna dissecada, 
expondo músculos e ossos, antes de ser executado. Outras gravações e 
fotos mostram detentos decapitados. Segundo o texto, uma das vítimas foi
 encontrada na lixeira do presídio, com partes do seu corpo distribuídas
 em sacos de lixo. “Presenciei uma situação em que, depois de deceparem a
 cabeça do indivíduo, eles abrem a barriga e a colocam dentro, 
espalhando as vísceras”, afirma Martins.
 Após
 a vistoria realizada no mês passado, o relatório concluiu que a 
situação do presídio está fora de controle. “Verificou-se que não há 
mais condições de manter a integridade física dos presos, seus 
familiares e de quem mais frequente os presídios de Pedrinhas”, informou
 o documento.
Nos autos, Martins afirma 
que os agentes penitenciários tinham que negociar com os presos para ter
 acesso aos pavilhões e tinham medo deles porque a equipe do CNJ estava 
inspecionando a unidade em dia de visita íntima, que poderia ser 
interpretado como um “ato de desrespeito” por parte dos detentos. 
Martins relata que atiraram um olho humano nele durante a vistoria.
Estupros
Relatório
 do CNJ denunciou a prática de abuso sexual contra esposas, irmãs e 
filhas de presos pelos chefes das organizações criminosas. Segundo o 
juiz do CNJ Douglas de Melo Martins, encarcerados por crimes menores 
prostituem familiares para não serem mortos pelos líderes das facções, 
que ditam as regras no presídio. As visitas íntimas acontecem com as 
celas abertas e em ambientes coletivos.
Distúrbios mentais
 – Outra denúncia grave feita pelo CNJ é a convivência de portadores de 
distúrbios psiquiátricos com presos comuns, em Pedrinhas, por falta de 
vagas em unidades de saúde para internação cautelar. “Este fato por si 
só já constitui grave violação de direitos humanos, mas poderá ter 
outras consequências, tais como eventual extermínio dos doentes 
mentais.”
Por fim, o magistrado pede 
providências urgentes para conter a onda de violência em Pedrinhas como a
 construção de novas penitenciárias no Estado. Após as denúncias, o 
governo do Maranhão anunciou que sete prisões serão construídas e duas 
estão em fase final de conclusão, todas no interior maranhense. Roseana 
também mobilizou a Polícia Militar para assumir a segurança do presídio.
 Antes da virada do ano, Pedrinhas foi vistoriada por agentes da Força 
Nacional de Segurança e a Tropa de Choque da PM que apreendeu cerca de 
300 armas artesanais, celulares e drogas no local.
Em
 nota, o governo explicou que “o agravamento da situação no sistema 
penitenciário ocorreu depois que foram tomadas medidas saneadoras, como a
 reestruturação das unidades prisionais, a mudança de comando nas 
Polícias Civil e Militar e na Secretaria de Administração Penitenciária 
do Estado (Sejap)”. O governo também afirmou que está agindo em conjunto
 com outros setores e órgãos dos direitos humanos para “devolver a 
normalidade” ao presídio e “assegurar os direitos e a integridade de 
seus usuários”.
 






 
 
 

 

 
 
 
 
 
 
 
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